Muito antes de Paris existir para mim, ela já existia em mim. Cresci ouvindo histórias de um tempo em que meu pai morou lá, a Paris de Picasso, de Elizabeth Taylor, dos cafés cheios de fumaça e dos apartamentos com janelas altas que se abriam para o Sena. 

As narrativas eram tantas que, ainda criança, eu achava que já conhecia a cidade. Paris era para mim uma presença de família, uma cidade que não se visita, mas se herda.

Da minha mãe, herdei outra Paris. Muito antes de modelos brasileiras cruzarem as passarelas internacionais, ela fez parte de uma geração pioneira. Foi modelo de prova de Karl Lagerfeld, na Chanel, de Yves Saint Laurent — para os quais também desfilou, e outras casas que, naquela época, definiam o que o mundo chamava de luxo. 

A fachada da La Maison Deyrolle. NekomuraKatsuo/iStock

Quando cheguei a Paris pela primeira vez, tive a sensação de estar dentro de uma realidade aumentada das histórias que cresci ouvindo. Tudo me parecia familiar, como se a cidade apenas tivesse ganhado luz. Lembro que meus olhos se encheram d’água ao vê-la à noite pela primeira vez.  

No começo da vida adulta, morei por alguns meses em Paris. Desde então, a cidade tornou-se uma espécie de refúgio recorrente, um lugar ao qual volto com muita frequência e me sinto em casa, não importa se fico dois dias ou um mês. 

E tem lugares que, não importa quantas vezes eu já tenha ido, seguem recebendo minha visita: a Deyrolle, por exemplo, uma loja que parece saído de outro tempo — uma mistura de gabinete de curiosidades e museu naturalista, onde insetos, conchas e fósseis convivem em ordem poética. Gosto de entrar ali sem pressa, abrir gavetas, descobrir o mundo em escala reduzida. É um lugar que me lembra que o tempo pode ser paciente.  

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Casa Bini: É um italiano frequentado por parisienses que falam baixo e comem bem. Há algo reconfortante em saber que, mesmo em Paris, ainda se pode encontrar o calor de uma mesa italiana. Ali perto, na entrada do metrô Saint Germain-des-Prés, tem uma barraquinha de crepe que eu sou viciada! Quando morei em Paris, eu ia sempre depois das aulas, e minha companheira de morada, a Gabi, ficava genuinamente chocada com a frequência das minhas idas. Peço sempre o de marrom-glacê. 

O La Grande Cascade é de outra ordem. Um restaurante dentro do Bois de Boulogne, cercado de árvores, onde as famílias parisienses se reúnem e é bem especial aos domingos. O serviço é clássico, os gestos são antigos e o almoço pode facilmente durar uma tarde inteira. É uma experiência cara, mas é bem especial. À noite, há o Raspoutine: uma boate subterrânea, avermelhada, que parece ter parado no tempo. Indecifrável, anacrônico. 

A vida acontecendo em um dos cafés do Marais. Willy Mobilo/iStock

No estrelado Arpège, as verduras são tratadas como joias. Cada prato parece ter sido feito por alguém que entende que cozinhar é, também, um gesto espiritual. E mesmo o mais carnívoro dos seres humanos não resiste a esse deleite! E, entre uma refeição e outra, há sempre um ritual que nunca deixo de cumprir. Não importa se comi demais e, normalmente, a resposta é sim, quase todo dia me despenco até o Carette para comer o palmier. Sou viciada. A glutona que em mim habita sente que precisa aproveitar enquanto está em Paris para comer todos os que vai sentir falta quando voltar ao Brasil. 

Entre os museus, meu refúgio é o Musée de L’Orangerie. Fico diante das enormes ninfeias de Monet e esqueço o ruído do mundo. Há algo de profundamente curativo naquele espaço. O Palais de Tokyo é o oposto, vibrante, imprevisível, vivo. 

O icônico Palais de Tokyo. Elena Zolotova/iStock

E, quando quero apenas observar, sem pressa, sem compromissos, me sento em algum café e me permito ser parisiense e só assistir a vida passar. Muito provavelmente em Saint-Germain, e muitas vezes na boemia do Marais, no Café Charlot. Fico ali, vendo a cidade se desenrolar.  

Muitos lugares abrem e fecham, mas alguns resistem, e são esses que continuam voltando às minhas páginas.   

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