Prestes a completar 50 anos de carreira, ele sonha projetar um hotel nas Maldivas e, quem sabe, ter uma casa de campo na Provence ou na Toscana
Aos 15 anos, Sig Bergamin embarcou para a viagem que moldou seu futuro: partiu da pequena Mirassol, no interior paulista, em direção à capital do estado, onde terminaria a escola e faria o curso pré-vestibular para entrar na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. Formou-se na Unisantos em 1976, depois de atravessar boa parte do período da graduação descendo e subindo a serra todos os dias, de ônibus, pois logo entendeu que o mercado de trabalho se encontrava em São Paulo e era na metrópole que ele precisava estar. “Tem gente que vai para uma cidade de veraneio e já imagina uma mudança definitiva para lá. Eu não, eu gosto de voltar. Não consigo ficar embaixo de um coqueiro e ver a vida passar. Até hoje penso assim”, conta o veterano (e viajado) arquiteto e designer de interiores.
Sig domina como poucos a arte da composição entre móveis, obras de arte, objetos, estampas, cores e tecidos. Recentemente, sua obra pautou pela terceira vez uma publicação premium da Assouline, selo editorial conhecido por refinados coffee table books na área de arte, arquitetura e design.
Embora seus projetos sejam frequentemente associados ao maximalismo, ele afirma ter inaugurado uma nova fase: “Andei mudando um pouco o meu estilo. Mais modernismo, peças dos anos 1950 e 1960, menos antiguidades”, destaca.
Grande parte de seu repertório veio na bagagem de visitas a países como Índia, Tailândia, Laos, Camboja e Japão. Nova York e Paris, bases internacionais de seu escritório, são suas segundas casas. “O apartamento nova-iorquino é escuro, em tons de preto e marrom. Já o de Paris é colorido pra burro. É outra atmosfera, outro Sig”, diz, reiterando que não separa mais trabalho de lazer nas viagens. “Está tudo misturado”, constata ele, que tem declinado alguns convites para sair de São Paulo. “Estou muito preguiçoso. Ah, tão bom poder ficar em casa”, suspira, recém-instalado num endereço novo em São Paulo e com passagem marcada para Paris, Saint-Tropez, Taormina e Capri. A seguir, ele relembra a infância, o início da carreira e (prepare-se!) sugere um roteiro de viagem à Ásia.
Quais são suas lembranças da infância em Mirassol?
Nossa, tantas lembranças boas… Minha infância foi no campo. Gostava de subir nos pés de manga do pomar da nossa casa. No sítio meu pai cultivava de tudo, e eu vivia no meio da plantação de tomates… Também me lembro bem do tachão que minha mãe usava para fazer a geleia de mocotó. Mas a maioria das minhas memórias é desses espaços externos, não da casa. Morei lá até os 15 anos. Aí vim sozinho para terminar a escola em São Paulo e fazer um cursinho pré-vestibular. Juro, não sei como me virei, eu era uma criança. Sentia muitas saudades, mas já sabia que queria entrar na universidade, construir uma carreira. Quando passei na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo de Santos, me mudei para lá e fui parar numa república. Um período difícil, porque eu não me encaixava, era supercareta, mauricinho, nunca matei aula na praia, nada disso
Como foi o início da sua carreira? Por que você enveredou para o design de interiores?
Tudo aconteceu espontaneamente. Muitos dos escritórios onde trabalhei eram focados em interiores e arquitetura. E passei por vários, porque precisava pagar a faculdade. No segundo ano da graduação, decidi voltar a viver em São Paulo para estar mais perto das oportunidades. Primeiro morei numa pensão, mas logo aluguei um apartamentinho na Avenida Paulista, perto do Parque Trianon. Passei quatro anos indo para Santos e voltando todos os dias de ônibus. Estagiei com Silvio Oppenheim, Marcos Tomanik, e foi assim que aprendi a desenhar. Minha trajetória, no começo, foi muito orientada para tirar o diploma, abrir meu escritório e começar minha vida.
Quais foram seus primeiros clientes?
Ah, gente do interior, uma pessoa de Mirassol que tinha um apartamento aqui… Eram sempre coisinhas pequenas. Mas muito rapidamente fiz amigos importantes, como o [empresário] José Victor Oliva e o [arquiteto e designer de interiores] Ugo di Pace, que, na época, estavam pensando no The Gallery [casa noturna paulistana famosa entre os anos de 1980 e 1990]. Eles me convidaram para o trabalho — e esse não só foi meu primeiro projeto de arquitetura como o maior da minha vida.
Quando foi que o José Antônio virou o Sig?
Esse sempre foi meu apelido de infância. Depois entendi que José Antônio não era uma marca, mas Sig, sim. E incorporei oficialmente ao meu nome.
Como aconteceu a expansão para Nova York e Paris?
Sempre quis fazer sucesso fora do Brasil, porque santo de casa não faz milagre. Então, no começo dos anos 1990, montei o escritório de Nova York e fui muito bem-aceito no meio editorial, que divulgou meu trabalho. Em 2000, abri o de Paris. Onde tenho projeto, tenho uma base, um lugar que me representa.
Você se sente em casa nessas cidades?
Sim, pra burro, porque estou sempre rodeado das minhas coisas pessoais. É o conforto do lar, doce lar. São endereços que, cada um a seu modo, têm a minha cara.
Como são suas viagens a lazer?
Tenho viajado de férias só no fim e no meio do ano mesmo, mas não separo mais o que é lazer do que é trabalho. Já fui 18 vezes à Índia. O Oriente me conquistou. Sempre trago de lá muitas referências, além de tecidos e objetos. Sou fascinado pela Tailândia, pela música, pela comida, pelas cores.
Qual é sua melhor recomendação de roteiro de viagem?
Pegue um voo para Dubai e de lá siga para a Índia — Nova Deli e Rajastão. Depois, rume para a Tailândia e visite Bangkok e as ilhas. Termine o tour no Japão, passando pelo menos por Tóquio e Quioto.
Se pudesse escolher um lugar no mundo, qual seria e por quê?
Ah, uma casa de campo no sul da França ou na Toscana, regiões onde a luz é maravilhosa, as flores, as frutas… Uma construção antiga, mas com móveis modernos e sem pretensão de nada, deixando o vento entrar, o vento sair, sabe? Uma atmosfera bem tranquila… Penso em montar um refúgio assim daqui a alguns anos, quando me aposentar. Mas acho que, se a gente parar, a cabeça para. Quero sempre estar me mexendo, mas não tanto como agora. Um pouco menos. Baixar a bola, trabalhar menos e curtir.
Você fala sempre sobre sues panos, tecidos que compra em viagens. Como você os escolhe e como os usa depois?
Adoro! Estão guardados em caixas, mas lembro de cada um deles. Eu compro mesmo sem saber ainda para o que vão servir. Aí acabo encaixando em algum projeto. Pena que não usei nada disso no apartamento novo, mas agora a proposta é outra. Depois dos muranos e dos panos, estou mais focado em cerâmicas dos anos 1940 e 1950.
Como é seu acervo pessoal? Onde você guarda, como o organiza, como faz para consultá-lo?
Tenho um depósito, mas é tanta coisa… Juntou o que eu já tinha com o que veio das casas que desmontei em Miami e na Fazenda Boa Vista. Estou numa fase de identificar e catalogar tudo, tenho uma pessoa trabalhando só nisso. Devo ter juntado por volta de 10 mil itens.
E qual é o maior tesouro desse acervo?
Impossível dizer. Considero tudo importante, por isso nunca vendo nada.
Como anda a produção do documentário sobre sua vida e obra?
Vixe, está no comecinho ainda. Já filmamos um pouco, mas ainda precisamos captar em Nova York e em Paris. Não sei onde eu vou encontrar tempo, minha vida está meio maluca.
Tem vontade de fazer televisão?
Não, não, não! Já imaginou se acordo mal-humorado e preciso gravar?
Quais são seus próximos planos?
O escritório tem projetos legais e está indo bem, pretendo continuar assim. Livros como os da Assouline abrem portas, trazem potenciais clientes. Chego a montar propostas que só não vão adiante porque muitas vezes a logística se complica demais. Conto com uma excelente equipe, mas quem me procura busca o contato direto comigo. De toda forma, ainda gostaria de fazer algo grande fora do país, como um hotel nas Maldivas.
























